Existe uma solidão que é maior que todas as outras. Uma solidão é tão próxima de nós que algumas pessoas não a percebem. A solidão de ser "você". Você é um ser só. Não importa o que os outros digam. Não importa o que você pense em contrário... Todo ser humano é só. Não falo aqui daquela solidão que sentimos quando não há mais ninguém ao lado. Nem mesmo da sensação de solidão, de incompreensão. Falo de uma solidão que chega a ser quase palpável de tão real.
Por mais que existam pessoas ao nosso redor. Por mais que tenhamos amigos e família. Por mais que sejamos seres gregários, somos sós. Porque ninguém pode ser você. Ninguém pode tocar tão intimamente você como você mesmo. Ninguém o conhece tão bem como você...
As outras pessoas sabem de nós apenas o que nós permitimos que elas saibam. Apenas o que nos convém. Sabem das nossas tristezas apenas o suficiente para nos confortar... das nossas alegrias apenas o suficiente para compartilhá-las... das nossas verdades apenas o que queremos mostrar. Nunca dizemos absolutamente todas as nossas verdades. Às vezes sequer as dizemos para nossa imagem no espelho. Este conhecimento tão profundo de nós mesmos está trancado e não pode ser alcançado por quem quer que seja.
Esta solidão pode ser comparada, ou explicada, com a morte. Não falo da morte espiritual, da alma, da essência, ou seja lá que nome cada pessoa dê a ela. Refiro-me ao momento final da existência humana. No momento de nossa morte física ninguém mais poderá estar conosco. Ninguém poderá amenizar este sofrimento. Ninguém o fará por nós. Porque apenas você  pode fazê-lo. Então, iremos sozinhos... Porque estamos e somos sós. Nascemos assim. Vivemos assim. Morreremos assim...

(Elís Cândido/abril de 2012)

Identidade Perdida


eu sou a filha da Irene.
eu sou a esposa do Beto.
eu sou a mãe da Clara e do Caio.
eu sou a funcionária da Prefeitura.
eu sou "aquela menina que fala com os cachorros".
eu sou aquela que gosta de plantas...
eu sou isto.
eu sou aquilo.
eu sou esta.
eu sou aquela.
queria ser apenas Eu.

(Elís Cândido/abril de 2012)

Estatística


Depois do estouro,
o silêncio
E mais nada.
Lembro de estar andando.
Eu sorria.
Lembro do vento em minha nuca.
Um vento quente
feito o hálito da morte.
E depois,
o silêncio.
Uma pequena correria.
Sussurros talvez.
E um arrepio frio
cortando toda a minha carne.
Eu estava lá.
Caído.
Lugar errado, na hora errada.
Alvo certeiro
de uma bala perdida.
Num instante
deixei de ser quem eu era
e me transformei em estatística.

(Elís Cândido/abril de 2012)

Eu...


Da janela do meu quarto
posso ver o mundo,
suas cores,
movimentos
suas dores.
Posso sentir a vida
que bate frenética
nas veias de cada rua,
de cada passo apressado,
de cada momento.
Queria me lançar por estas ruas.
Correr entre as pessoas,
me perder na multidão.
Queria me perder de mim...
Mas as paredes não deixam.
Paredes que eu mesma ergui
e já não consigo transpor.
Me deixo ficar.
Estou só.
Sou apenas uma imagem embaçada
na vidraça da vida.